\\ PESQUISE NO BLOG

sábado, 27 de novembro de 2010

"Quem precisa de Édipo?"

Publicado em 08 de julho de 2010
Christian Dunker
Quem acompanha o cinema adolescente encontra reedições de narrativas mitológicas tais comoPercy Jackson Fúria de Titãs. Enquanto o mundo dos adultos sofre com a redução de grandes narrativas no amor ou no trabalho e com a crescente interpretação do desejo segundo uma lógica de encontros intensificados pela fugacidade, o mundo das crianças prospera à base de epopeias comoNaruto Pokemón. A mitologia grega é um intrincado labirinto de histórias que se cruzam retomando personagens e cenários que constroem pacientemente um sentido que se alterna entre a força dos personagens e a intensidade da situação. Que Naruto, a raposa de nove caudas, seja depositário de um gênio maligno para o qual ele deve encontrar um destino, e que os desafios que ele encontra sejam monótonos em estrutura e forma, isso acusaria o gosto infantil pela repetição da mesma história ampliada por extensões minimalistas. Tal como um dos grandes romances realistas, é preciso mostrar, diante de um mundo demasiadamente complexo e indeterminado, que ele no fundo se compõe de variedades combinadas do mesmo. Diante dele, ingenuidade e esperteza invertem-se constantemente em astúcia dialética.

Édipo fora do lugar?
Comparando a exiguidade narrativa do adulto, que não consegue passar de cinco ou seis temporadas sem que o argumento de seus seriados se esgote, com a proliferação de milhares de páginas medievais envolvendo lobos vampirizados, bruxos aprendizes e anéis mágicos, uma história básica como a de Édipo estaria fora de lugar ou tão demasiadamente no lugar quanto um vestido de tubinho preto. Não é nem extensa o suficiente para nos levar à letargia da promessa adiada, nem é breve e compacta como o que precisamos para este solve problem quizz que se tornou nossa vida prática administrada. Não é nem drama nem aventura, não ganha nem por pontos nem por nocaute. Fica no empate técnico ou na mistura indefinida de estilo devorado pelo gênero. As implicações que Freud teria tirado dessa história, para falar da universalidade trágica do ser humano, parecem cada vez mais datadas e expressões particulares mal-intencionadas. A soberania de um tipo de família paranoica, dirá Deleuze; uma forma de neutralizar a sexualidade no registro da herança, dirá Foucault; uma maneira de justificar o pensamento colonial, masculino e heterossexual, ponto.
Muitos psicanalistas têm defendido a aposentadoria gradual e compulsória das ideias edipianas: uma verdade a ser descoberta, a decifração do sentido, o primado da autoridade do pai e da inviolabilidade da mãe, a relevância dos laços verticais de identificação, a aspiração de universalidade do desejo em confronto com a lei. Édipo seria uma figura passadiça. Obcecado com seu passado de fugitivo matador de esfinges, excessivamente identificado com seu papel social de tirano, potencialmente culpado ou suspeito de crimes que não sabia ter cometido. Os herdeiros de Lacan, conhecido pela operação de salvamento estrutural do Édipo (importada de Lévi-Strauss), estão divididos entre os que acreditam que as estruturas antropológicas como o Édipo ainda nos servem e os que consideram isso coisa do passado. O que importa agora são sistemas, ordens ou processos, quiçá fluxos, não histórias, narrativas ou estruturas.
Cada época tem o Édipo que merece e inversamente cada Édipo tem a época que consegue criar para si. Édipo é o protótipo do herói, ou seja, aquele que consegue compreen-der em si as contradições de seu tempo. Ele pode ser elevado e sublime como o Édipo hegeliano ou degradado e demasiadamente humano como o Édipo freudiano, isso não é tão relevante quanto o fato de que ele é um herói, e que as formas e fontes de seu conflito têm se demonstrado, até agora, renováveis. Isso significa que ele é candidato natural a ocupar a posição-chave de intermediário e articulador entre a grande narrativa infantil e repetitiva e o conto curto e funcional da narrativa adulta e errática. Há Édipo desde que há literatura, e até mesmo antes dela, se considerarmos que a codificação, tanto pelo gênero épico de Homero e Hesíodo quanto pelas tragédias, apreen-de a tradição oral e mítica que lhe antecedeu. A questão não é saber se aquele herói vive ou morre em nossos dias, mas qual seria seu substituto. Nem mesmo Nietzsche imaginou um tempo sem heróis. Frente ao consumo tóxico de sentidos extensos e intensos, quero crer que Édipo ainda tem direito a candidatar-se como solução de sustentabilidade.

Caráter contingente
O que temos de deixar para trás é esta crença n’o Édipo, ou seja, aquilo que Ordep Serra (O Reinado de Édipo, UnB-Universa) chamou de o mito do mito de Édipo. Bem longe do relativismo desconstrutivista, devemos insistir no caráter contingente de “nosso Édipo”. Poucos se lembram que existiu um Édipo de Ésquilo e outro de Eurípedes, ambos perdidos. Especula-se que nesses Édipos Jocasta seria a personagem central, controlando perfidamente os cordões da armadilha que levaria à lúbrica experiência de poder e dominação sobre seu filho incauto e ingênuo. Édipo foi recodificado pelos cristãos em duas vertentes. Na primeira, ele é encenado por Judas Iscariotes, em uma novela de parricídio protagonizada pelo grande criminoso. Na segunda, ele é transfigurado no papa Gregório e nesse caso não há parricídio, mas incesto sugerido que termina com nosso herói feito mártir ou santo. Soterramos que Édipo foi reescrito e humanizado por Voltaire, colocado em oposição estrutural aoParsifal por Wagner, citado em Hamlet, parafraseado em Crime e Castigo. Isso sem falar nos Édipos sem nome, ou seja, nas versões do mito que não se referem a nenhum aspecto da narrativa, senão em sua repetição homóloga e estrutural à tragédia grega, ou ainda ao fato de que Édipo Rei é uma das peças de uma trilogia de Sófocles, continuada em Édipo em Colona e em Antígona.
Um ótimo exemplo de como podemos brincar de criar nosso próprio Édipo, sem que isso represente apenas confirmação de nossos próprios preconceitos, é a peça de Antonio Quinet Óidipous Filho de Laios – a História de Édipo pelo Avesso [em cartaz no Teatro Fábrica, em São Paulo], na qual encontramos nosso protagonista vestindo terno e debatendo-se em ataques de cólera contra Creonte, Tirésias, Jocasta e os escravos, que trajam vestimentas indígenas do Xingu. Uma catarse para nossa época, de um lado a profusão narcísica da potência em fazer o próprio destino; de outro o choque traumático do real, sem nome, sem máscara, sem imagem. Eis a mistura tão conhecida entre a rapidez narrativa do executivo e a extensão épica da criança; a combinação entre o soberano arrogante e a queda brusca na humilhação; a desmesura do gozo e a desorientação do desejo. Não apenas um herói fraturado, ou seja, um herói cuja excepcionalidade está em portar aquilo que não pode ser reconhecido por sua época, mas a expressão da dificuldade para localizar heróis que sobrevivam aos seus atos. Os de sempre, adultos ou infantis, os há por toda parte, mas o excesso nesse caso, como em outros, aponta apenas para a falta.
Édipo nunca foi, nem mesmo para a psicanálise, apenas uma história de amor pela mãe e de hostilidade pelo pai. Essa redução testemunha nossa redução paródica de todo e qualquer personagem que se queira apresentar como herói. Ficamos sem alternativa. Aquele que se apresenta como tal estará identificado demasiadamente ao seu lugar social, o que é o protótipo de nosso anti-herói. Aquele que não o faz – ou seja, que não é consequente com sua posição – terá seu ato julgado no quadro do cinismo e recairá, portanto, no anti-herói da eficácia instrumental. Reunindo os dois casos, temos o depressivo como anti-herói e, por inversão, o maníaco como pseudo-herói, mas onde está o verdadeiro herói? Se é que precisamos de um, ainda voto no pai de Antígona, filho de Laios.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

fuga (do textocentrismo)


sem querer eu me vejo fugindo do texto. não porque queira evitá-lo ou porque artaud e seu teatro da crueldade me fizeram querer tentar outro tipo de palavra, de texto. não é isso. eu neste momento estou fugindo do texto porque não o tenho ainda. e porque também não estou a buscá-lo. assim, eu diria, é natural parecer que estou fugindo. é natural fazer parecer que não estou nem ai para um texto, dramaturgia ou punhado de palavras.

e indo assim nesse sentido, tenho redescoberto alguma necessidade real. tenho pensado no que há no texto que me seja essencial e que me faça querer tê-lo de novo outra vez. ao mesmo tempo (é terrível, eu sinto) todo o texto feito de palavras pode ser pelo corpo reescrito. são línguas diferentes que podem dizer a mesma coisa. variam-se os meios. será mesmo? ainda duvido.

faz uma ou mais semanas que não leio O ANTI-ÉDIPO. estou correndo com outro projeto do teatro inominável e acabei dando um pause. engraçado, porque no artigo que publiquei anteriormente (do carlos diegues e que havia sido pescado para esta outra peça do inominável), o autor faz referência a édipo, num ponto preciso que faz a melhor tradução até agora do O ANTI-ÉDIPO para termos concretos.

ele diz que se não tivessem contado a édipo que sua mãe é jocasta, eles teriam vivido felizes para sempre. remonto ao primeiro período da faculdade quando descobria que o conhecimento é capaz de levar ao sofrimento. era essa a coisa dos trágicos. o saber. o quanto o saber poderia trazer certo júbilo e inevitável tristeza. estamos falando então da necessidade de ser ignorante? não. parece simples demais. mas existe alguma coisa ai que me sugere algo ainda nem de perto vislumbrado.

a ignorância possui em si certa sabedoria que nós, seres do saber, não soubemos ainda desvendar. talvez porque sua imagem - e nome - nos afastem demasiadamente rápido.

enfim, ao invés de palavras tenho pensado em imagens. há alguma necessidade minha por concretude. esse nome está me tragando e tudo então passa a lhe fazer referência. imagino dois, três atores em cena. e o que os costura é a sua capacidade de ser concreto, de intervir um no respirar do outro e de instaurar o desespero ou a salvação. eles - os atores - sendo concretos, sendo inteiros e certeiros. menos espaços para especulações e sim, dessa vez, mais verdades. ser verdade não quer dizer deter razão. ser verdade dentro de um contexto específico onde se crê veementemente naquilo que se diz e faz. ainda que não se tenha crença, de fato (o ator sendo o personagem).

não quero por agora falar de ator e personagem. quero falar da agonia que me toma ao ler freud teorizando a vida de schreber. quero falar da agonia que freud me dá quando vem dar sentido único à poesia de uma vida. quando vem dar nome-doença às idiossincrasias. freud está me enojando. e a seu despeito, creio mais em metáforas do que em diagnósticos.

talvez por isso esteja pensado mais em imagens do que em palavras. mais em atores do quem em textos.

\\
Diogo Liberano

domingo, 21 de novembro de 2010

"Fundamentalismo da Tristeza"

Clique sobre a imagem para vê-la em tamanho original.

Artigo de Carlos Diegues, publicado no dia 20 de novembro, no jornal O GLOBO. Ele diz que se não tivessem contado a Édipo que sua mãe é Jocasta, eles teriam vivido felizes para sempre.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

história-destino

caramba. é realmente uma criação sobre chão móvel. nada está seguro e não vejo segurança no horizonte. portanto, é patinar. dançar sobre o escorregadio e escorregar, fluir para dentro de certas covas que não se sabe para onde serão capazes de levar.

falo de dramaturgia. falo da tal história. sem mais delongas, ponho hoje em dúvida: é um novo texto que irei escrever?; é uma dramaturgia contemporânea que ainda não conheci?; é um texto mais clássico sobre o qual vou me lançar?; é um texto clássico que vou reescrever para este instante em que aqui estou especulando?...

pode ser muita coisa. a abertura é dez vezes maior. por isso, calma. calma para ir tramando com calma aquilo que não pode ser pressa, posto exija amor, sobretudo, amar. sendo assim, registro essa pequena angústia que serve. que pontua com clareza exata o porquê de seu aportar.

que história é essa se já estou decidido que se trata de uma história para contar? deleuze e guatarri me alimentam na busca. na forma pela qual consigo agora enxergar o mesmo e dele fazer saltar aquilo ali que estava adormecido, amortecido, fantasiado, incapaz de fuder, de magoar...

acabamos de fazer quatro apresentações de NÃO DOIS e em dezembro uma temporada de seis apresentações de VAZIO É O QUE NÃO FALTA, MIRANDA. a leitura de MEMÓRIAS DE UM DOENTE DOS NERVOS está acabando comigo. é incrível demais. preciso dizer, ainda que sem nem entender o porquê - mas sinto - estou começando a implicar com freud.

falo de concreto. não mais metáforas. desejo duro e preciso. não mais sonhos. o último sonho será por fim desenhado e terá por nome encenação. por hoje é isso. amanhã mudamos tudo outra vez.

por último, estou fechando um elenco para uma peça que não sei qual será. de repente eu deva me reunir com eles e aumentar, assim, nosso campo de especulação. será?

\\
Diogo Liberano

terça-feira, 16 de novembro de 2010

AS MÁQUINAS DESEJANTES, 05


CAPÍTULO I - AS MÁQUINAS DESEJANTES

I.2. O CORPO SEM ÓRGÃOS

I.2.2. PRODUÇÃO DESEJANTE E PRODUÇÃO SOCIAL: COMO A ANTIPRODUÇÃO SE APROPRIA DAS FORÇAS PRODUTIVAS.

As formas de produção social implicam também uma parada improdutiva inengendrada, um elemento de antiprodução acoplado ao processo, um corpo pleno determinado que pode ser o capital.

O capital não é o produto do trabalho, mas aparece como seu pressuposto natural ou divino. O capital é o corpo sem órgãos do ser capitalista, por produzir a mais-valia, da mesma forma que o corpo sem órgãos se reproduz a si próprio. É no capital que se engancham as máquinas e os agentes, fazendo tudo parecer produzido por ele sendo ele - o capital - enquanto quase-causa.



O específico do capitalista é o papel do dinheiro e o uso do capital como corpo pleno para formar superfície de inscrição ou registro, pertencente às sociedades como constante da reprodução social.



\\
Diogo Liberano  

AS MÁQUINAS DESEJANTES, 04

CAPÍTULO I - AS MÁQUINAS DESEJANTES

I.2. O CORPO SEM ÓRGÃOS

I.2.1. A ANTIPRODUÇÃO. REPULSÃO E MÁQUINA PARANÓICA.

Entre as máquinas desejantes e o corpo sem órgãos surge um conflito aparente, pois cada ruído de máquina torna-se insuportável ao corpo sem órgãos. Às máquinas-órgãos, o corpo sem órgãos opõe sua superfície deslizante, opaca e tensa. Aos fluxos, opõe seu fluido amorfo indiferenciado.

O recalcamento dito originário seria essa repulsão das máquinas desejantes pelo corpo sem órgãos, enquanto a gênese da máquina paranoica ocorre na oposição entre o processo de produção das máquinas desejantes e a parada improdutiva do corpo sem órgão.
"A máquina paranoica é uma mutação das máquinas desejantes: resulta da relação das máquinas desejantes com o corpo sem órgãos, na medida em que este já não pode suportá-las" (P.22).
\\
Diogo Liberano  

terça-feira, 9 de novembro de 2010

AS MÁQUINAS DESEJANTES, 03

CAPÍTULO I - AS MÁQUINAS DESEJANTES

I.1. A PRODUÇÃO DESEJANTE

I.1.5. PRODUÇÃO DO CORPO SEM ÓRGÃOS.

Dessa identidade produto-produzir surge um terceiro termo na série linear: ENORME OBJETO NÃO DIFERENCIADO.

Já que tudo se coagula e depois recomeça, seria melhor que nada funcionasse. Estando os fluxos de energia ainda muito ligados, assim também os objetos parciais são muito orgânicos. E dessa forma, um puro fluido em estado livre - sem cortes - está em vias de deslizar sobre um corpo pleno.
"As máquinas desejantes fazem de nós um organismo; mas, no seio dessa produção, em sua própria produção, o corpo sofre por estar assim organizado, por não ter organização outra ou organização nenhuma" (P.20)
O corpo pleno sem órgãos é, portanto, o improdutivo, o estéril, o inengendrado, o inconsumível. Artaud o descobriu, sem forma e sem figura. Tem por nome instinto de morte, logo a morte, aquela que não fica sem modelo.

Assim, é natural do desejo desejar a morte também. Alcançar o corpo pleno da morte é atingir a imobilidade do motor, é atingir a imobilidade da máquina, assim como deseja a vida.

\\
Diogo Liberano  

AS MÁQUINAS DESEJANTES, 02

CAPÍTULO I - AS MÁQUINAS DESEJANTES

I.1. A PRODUÇÃO DESEJANTE

I.1.3. MÁQUINA DESEJANTE, OBJETOS PARCIAIS E FLUXO: E... E...

As máquinas desejantes são máquinas com regra binária ou regime associativo: sempre uma máquina acoplada a outra. A síntese produtiva - produção de produção - tem uma forma conectiva "e", "e depois...". Uma máquina produz fluxo que é cortado (extração de fluxo) pela outra que lhe está conectada.

A série binária é linear em todas as direções. O desejo não para de efetuar o acoplamento de fluxos contínuos e de objetos parciais. Todo "objeto" supõe já a continuidade de um fluxo e todo fluxo supõe a fragmentação do objeto.

Assim, cada máquina-órgão interpreta o mundo segundo seu próprio fluxo (o olho, por exemplo, interpreta o mundo vendo-o).


I.1.4. A PRIMEIRA SÍNTESE: SÍNTESE CONECTIVA OU PRODUÇÃO DE PRODUÇÃO.

Objeto parcial-fluxo: eis o acoplamento da síntese conectiva, também traduzido como produto-produzir.

Henri Michaux descreve uma mesa esquizofrênica em função de um processo de produção que é o do desejo. O esquizofrênico é o produtor universal para o qual ocorre uma indiferença do produzir e do produto, do conjunto instrumental e do conjunto a ser realizado.

"A satisfação do bricoleur, quando liga alguma coisa à corrente elétrica, quando desvia um conduto de água, seria muito mal explicada por um jogo de 'papai-mamãe' ou por um prazer da transgressão. A regra de produzir sempre o produzir, de inserir o produzir no produto, é a característica das máquinas desejantes ou da produção primária: produção de produção". (P.17/18)

[...]

\\
Diogo Liberano

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

AS MÁQUINAS DESEJANTES, 01

CAPÍTULO I - AS MÁQUINAS DESEJANTES

I.1. A PRODUÇÃO DESEJANTE

Há tão somente máquinas. Uma máquina-fonte que emite um fluxo que uma máquina-órgão corta. Sempre fluxos e cortes. O que se produz são efeitos de máquina e não metáforas.

I.1.1. PASSEIO DO ESQUIZO.

Melhor do que o neurótico sobre o divã, uma relação com o fora. Mas tudo compõe máquinas. Lenz, por exemplo (LENZ, de Georg Büchner) não vive a natureza como natureza, mas unicamente como processo de produção.
"Acredita-se muitas vezes que Édipo é fácil, que é dado. Mas não é assim. Édipo supõe uma fantástica repressão das máquinas desejantes. E por quê, com que fim? Será verdadeiramente necessário ou desejável curvar-se a isso? E com o quê? O que se há de colocar no triângulo edipiano, com o que formá-lo?" (P.13)
I.1.2. NATUREZA E INDÚSTRIA. O PROCESSO.

O esquizofrênico vive a natureza como processo de produção. A indústria (que se opõe à natureza) também absorve seus materiais e ainda lhe restitui seus resíduos. Ou seja, não há esferas nem circuitos independentes: a produção é imediatamente CONSUMO e REGISTRO.

1º SENTIDO DE PROCESSO: inserir o registro e o consumo na própria produção (são produções de um mesmo processo). E o homem se revela como o eterno encarregado das máquinas do universo, ligando uma máquina-órgão a uma energia.

2º SENTIDO DE PROCESSO: homem e natureza são uma só e mesma realidade essencial do produtor e do produto. A produção excede categorias ideais e forma um ciclo ao qual o desejo se relaciona como princípio imanente.

3º SENTIDO DE PROCESSO: o fim de todo processo não é a sua própria continuação ao infinito, ou seu fim, ou alguma meta, mas sua efetuação.
"A esquizofrenia é o universo das máquinas desejantes produtoras e reprodutoras, a universal produção primária como 'realidade essencial do homem e da natureza'". (P.16)
[...]


Inicio de uma espécie de fichamento, certa decupagem sobre os escritos de Deleuze e Guatarri em O ANTI-ÉDIPO.


\\
Diogo Liberano