sim, falei anteriormente do meu redor. e o meu redor, inevitavelmente, me rodeia e me faz rodar. infelizmente, porém, sua dança por vezes é tão macabra que me faz querer desistir do passo, me faz querer parar no meio do caminho e solidificar. porém não fosse eu tão propenso ao impossível, eu já teria stopado de abrupto, já teria virado pedra e deixado de respirar. mas não, a força do meu redor é também sua fraqueza e é nela que eu encontro o aval necessário para combatê-lo e levá-lo ao encontro. sim, é perverso. eu sei.
no primeiro semestre de 2010, iniciei de forma prática um processo de direção dentro da universidade federal do rio de janeiro, no curso de direção teatral do qual sou graduando. o processo (que havia sido iniciado em outubro de 2009) resultou numa encenação da obra ESPERANDO GODOT de samuel beckett, que um mês depois das 2 apresentações curriculares na ufrj (em julho), cumpriu uma primeira temporada no teatro glaucio gill já como uma obra outra intitulada VAZIO É O QUE NÃO FALTA, MIRANDA (trabalho mais afinado do que aquele que havia estreado anteriormente na ufrj).
estava falando no redor para tocar na recepção acadêmica e universitária feita pela grande maioria dos professores em relação ao meu espetáculo. de uma cerimônia em que todos teceram seus comentários sobre os espetáculos integrantes da mostra universitária, infelizmente não tive muito o que retirar de suas opiniões em relação a minha peça, porque, assustadoramente, pouquíssimo foi falado sobre ela enquanto obra. o que era para ser um debate sobre o espetáculo virou um falatório incompreensível no qual se mesclaram discursos ultrapassados, demagógicos, preconceituosos e incoerentes. sobretudo, discursos pautados na tão famosa e démodé política da boa vizinhança, a partir da qual era necessário me rotular de excelente aluno para em seguida descerem-me o pau.
sim, isso me entristeceu profundamente. coloco uma reticências para ultrapassar o que não passou, de fato. [...] mas que o tempo leva, de qualquer forma. purguei meu horror das maneiras que pude, mas uma coisa não se purgou até agora: a exigência (que naturalmente não se assumiu enquanto tal) de que para me formar como um bom diretor teatral seria preciso concluir o curso apresentando uma encenação clássica.
santa incógnita que habita este céu sobre nós!, a que tempo pertencemos hoje? a que tempo eu pertenço neste agora? sim, mesmo que ninguém me responda, eu o faço, pois só há o agora tanto como resposta tanto como tempo para se responder toda e qualquer pergunta. não há outro tempo para a minha experiência enquanto aluno (e pessoa) que não seja está já, que acabou de passar, viste? eu vivo neste tempo como posso ser indicado a encenar nos moldes que não me pertencem, nos moldes que não me apetecem, nos moldes que fizeram já sua história, mas que - e isso me ensinaram - foram justamente moldes/respostas dados(as) ao terror do tempo contemporâneo ao de seus autores?
estou começando esse processo, eu acho, ainda acho, para tatuar sobre mim - neste tempo que me pertence e do qual sou partícula - a crença de que é preciso caminhar com os próprios pés. a crença de que assim como édipo (que já havia sido avisado de todo o seu destino antes mesmo d'ele começar), de que assim como édipo é preciso se perder por conta própria para poder se achar enquanto aquilo que se é.
acho que estou pronto para começar. como realizar uma encenação do maior clássico de todos? nunca foi feita uma encenação clássica de obra alguma. todas foram fruto de um determinado tempo e viraram clássicas nos corredores da história, no trotar das folhas, no escrever dos índices e nas salas de aula.
creio eu que testando a validade de toda a pompa de ÉDIPO REI sobre o nosso corpo de artistas é o que nos dará alguma coisa. testando se seus recalques ainda me seduzem. testando se suas rimas me seguram, se suas pausas me enrijecem. testando se todo o seu valor ainda me serve.
é este o desafio deste agora: tentar ser, de fato, ao invés de querer ser fato.
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Diogo Liberano