Trechos de uma matéria de Karl Erik Schollhammer, publicada no caderno PROSA & VERSO do jornal O GLOBO no dia 4 de junho de 2010.
“A escrita literária não é resultado da vontade do autor, da sua intenção ou da sua sensibilidade. Pelo contrário, a dinâmica neutra da escrita conduz ao apagamento da figura do autor, do anonimato necessário, à solidão essencial e ao estranhamento anti-lírico diante do mundo. Neste sentido, Blanchot é um precursor do anti-humanismo de Foucault e da ideia da ‘morte do autor’ desenvolvida por Roland Barthes que, até os últimos cursos de 1978 e 1979, persegua a determinação neutra que se impõe na emergência da literatura”.
“Para Blanchot, a poesia é um movimento de transgressão que subverte as fronteiras da linguagem comum e referencial bem como das formas convencionais sustentadas pela instituição literária, ou pela lei do gênero, na formulação de Derrida no livro de ensaio - ‘Parages’ (1986) – dedicado a Blanchot”.
“Blanchot não se interessa por um tipo de literatura narrativa e imaginosa que discute os problemas do mundo ou cria uma ficção de fantasia alternativa para ele. Não se satisfaz com a negação dialética do mundo e sua substituição pela ficção. Sempre procura uma literatura que interrompe o movimento da negação na afirmação de sua própria existência fora desse mundo”.
“Encontramos aqui um elemento fundamental na reflexão de Blanchot: por um lado registra o poder mortal da linguagem, que reduz o ser da coisa falada ao não-ser abstrato do seu conceito na palavra, e, por outro lado, articula à literatura a procura da realidade que foi perdida. Sua possibilidade está na materialidade da palavra, no seu aspecto físico: ‘o ritmo, o peso, a massa, a figura e, depois, o papel sobre o qual escrevemos o traço de tinta, o livro’”.
“A literatura emerge em sua independência, não mais uma expressão do escritor, não mais uma representação do mundo, mas um ‘bolo concreto de existência’, no espaço entre a linguagem e o mundo, o que ele denomina o ‘espaço literário’”.
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