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sábado, 20 de agosto de 2011

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18 de agosto, Colégio Andrews, 20h/22h
Dan, Laura, Virgínia, Andrêas, Márcio, Adassa, Thaís e Diogo

Cheguei por volta de 20h40. A Thaís começou o ensaio e quando cheguei eles já estavam jogando o CINTO DE SEGURANÇA. Eles ainda estão. Pela primeira vez eu me pergunto: por que eles se impedem uns aos outros? Por que não acordam, entre si, de maneira invisível, de que é preciso seguir?

Sei que são as regras. Mas vendo-os assim lado a lado, eu não tenho como não ver também suas personagens, ali, esperando, de prontidão. Este jogo é o impossível? Talvez não. Por um acaso, por uma surpresa, o impossível perde sua força e vira outra coisa do que simplesmente não. Enfim, acho que o Dan está cansado. Olhou para mim com uma cara cansada. O Márcio hoje está com calça e camisa pretas: será isso uma proposta? Adassa com os cableos soltos e longos. Volumosos. Criança ocupa espaço. As mães com camisas frouxas. Os pais taciturnos. Meu deus. Que noção de família estamos defendendo?

Peço que deixem o jogo terminar, com cada um, de um em um, podendo sair da cadeira e chegar até o limite. O jogo das famílias é muito interessante: quando um integrante da família vizinha se move, todos os outros o percebem.

COMPOSIÇÕES

CÉLIA 03 > “Eu uso um tapa-olho”

sapatos azuis, vestido com citas, quadrado translúcido de plástico – rosa, calça de moletom cinza claro;

 

célia posiciona o quadrado. ela olha. parece uma coisa tio raio-x. ela sugere um incômodo. de lado pra platéia, segura o quadrado que se aproxima lento do olho dela. ela está incomodada. ela diz eu. incômodo persistente. eu.

eu lavei louças pra distrair. estapeia a mão e vira de frente para nós. eu gosto dele, eh, gosto do rosto dele… tira uma canetinha do bolso e desenha no quadrado. o rosto dele tem um quadrado um pouco parecido com um coração. ai eu tentei desenhar um olhos dois olhos nariz grande boca pequena em cima da boca tem cutuca com canetinha o quadro acrílico e tem um brinco um macaquinho.

o macaquinho tem orelha. ele é um pouco curvado embaixo. o kevin gosta dele porque eu gosto também dele. não é estranho. não é estranho não é esquisito eu gosto o kevin também porque ele é diferente ele é um pouco redondinho embaixo ele tem uma fitinha que vem no cabelo. rodeando o cabelo.

frente a frente com o quadro. e ele tem uma característica que é o seguinte. ele pode ser muito diferente porque ele tem uns desenhinhos. ou não, ele pode ser branco, como, um pouco, eh, sujo, tampa a canetinha, novo, novo ele pode ser novo, ele pode ser velho, teve quantas aulas? não sei teve quatro três quatro aulas porque teve o quê? três quatro aulas o kevin impacientam-se os pés no chão, célia bate no quadro acrílico, briga com o “macaquinho”

lança a placa longe que faz um som estrondoso ao bater no chão.

ela olha ao público e diz: segunda coisa

ela bebe um toddynho sentada na cadeira (shefa)

ele morreu. era um bicho lagarto. ele morreu primeiro por fora e todos os amigos se lançaram pra dentro, pra cima, que ele era um bicho lagarto e ele morreu por fora e os amigos se lançaram e não sabem o que tem dentro porque o que tem dentro é um mistério. as coisas são assim é tudo um ciclo.

CORLEY 03 > “Um presentinho para Moira”

sobre a mesa, corley tira as roupas, fica de cueca e coloca uma samba-canção. coloca a roupa dentro da sacola plástica e veste uma calça social preta. esquece algo fora, desce da mesa, e volta com um cinto. sobre na cadeira, atrás da mesa e sobre a mesa novamente se coloca. uma camisa social com tons de verde, vermelho e azul marinho. ele se abotoa. abre a calça, coloca a camisa por dentro e fecha a calça. depois, o cinto. num tom marrom, esverdeado. corley olha para frente. no lugar da gravata coloca outro cinto que termina dentro da calça. ali sobre a coisa masculina.

tem na boca uma expressão estranha. bruta. coloca o paletó, preto. se vira. a mesa quase tomba. pega um cavaquinho e começa a tocar uma marcha nupcial. lenta. ele está apreendendo. tenta noutra nota. mais aguda. a coisa começa bem, mas não rola. ele pára. traz uma sacola da loja AQUAMAR. branca, com pequenas flores, delicadas. posiciona no chão, frente à mesa. sobe novamente sobre a mesa. olha para laura. que avança até a sacola e retira dela um vestido de noiva.

enquanto ele toca com quem será? moira coloca o vestido, mas não entra. leve desespero. ele ainda tenta. ela resmunga. não tá dando certo. ALGUÉM AJUDA ELA PELO AMOR DE DEUS!!! ela não consegue colocar o vestido, mas se oferece mesmo assim. sobram pontas, abas. corley a olha de cima da mesa, estranho.

EVA 03 > “Frank, meu amor, é só um desemprego”

parecem versos aleatoriamente falados. uma pilha de versos. uma pilha de versos. cortados. ela tira um. ele tira outro. quem sabe você não volte a mim? parecem dois namorados trocando versos, literalmente. se você se for. diz o outro. eu não sofro. a outra. treme, música, treme por favor. ela olha para ele. sempre. ele olha pouco. menos. e não é feito camões.

eva desliga o cronômetro e diz: momento dois.

SE VOCÊ ACHA QUE SÓ A SUA VIDA TÁ FUDIDA. QUE SÓ A SUA VIDA TÁ PERRENGUE. os textos se costuram. é uma briga de casal. pra terminar a nossa aula de harmonia do lar.

FRANKLIN > “Eu odeio essa cidade!

franklin sentado. a sua frente, na mesa, abre um sanduíche subway, com coca. tem um subway aqui pertinho de casa. eles não tem aquele de mussarela de búfala com tomate seco. na verdade, a parte da salada é um pouco defasada. mas é um subway, né?

eu fui levar as crianças hoje no colégio, as ruas tavam toda engarrafada. ai me falaram que acontece isso duas vezes por semanas. a cada dia tem um predio novo construindo. imagina quando as pessoas vierem morar nos seus prédios com crianças carros. mas tudo bem, tem um subway. esse morro daqui do lado parece que despencou o morro todo. desceu todo mundo. morreu. andei conversando com esse vizinho novo, falou que é uma cidade meio dormitório assim, sabe? as pessoas vem pra dormir. aqui parece que não acontece nada. mas acho que a gente acostuma, não é? não é?

olha para trás, eva não está. corley segue comendo. a coca na latinha acabou. ouve-se o barulho do canudo sugando o vazio. franklin levanta de brusco e sai em direção a eva. ela amassa o sanduíche.

ele soca a parede. ele chuta a parede. CIDADE DE MERDA! Ele grita pela janela.

KEVIN > “Preciso virar música?!

Começa fora de sala. Entra ágil.

Esse aqui é o meu quarto. Essa é a fechadura da porta do meu quarto. QUe é diferente da fechadura da porta da cozinha, que é dadaísta. Essa aqui é a porta do meu quarto. ela serve pra barrar o vento e o tempo.

E esse aqui é o meu quarto, o chão do meu quarto. Que é completamente do chão da sala do banheiro da cozinha. Eu fico compeltamente confuso quando eu venho do chão da sala e entro no chão do quarto, eu fico confuso. É limpo. É sujo, mas é mais limpo, porque é puro. Debaixo da cama é mais limpo. Debaixo da mesinha do computador é mais sujo.

Kevin mira a parede, sôfrego. Está sobre a cama, deita lento e se move, partiturado. O olhar emocionado, embargado. Ele se ergue, tocando a parede, e conta contra a parede

5, 4, 3, 2, 1. Mãe, que preciso ser música?

Vai abrindo os olhos lento e com os olhos semi-abertos vai se movendo como fosse cego. Toca nas coisas, na mesa, vai passando até tocar numa mochila, depois noutra mesa, Kevin avança até a cadeira próxima à janela e olha lá para baixo

Essa é ajanela do meu quarto. Não vou pular não. Mas também não tenho medo não. Nao tenho medo de ficar de olho fechado do quarto vazio da altura da janela da chuva lá fora não tenho medo do menino que fica la embaixo na rua me olhando pedindo toca um piano pra mim o medo que me devora tá aqui dentro.

MOIRA > “Eu odeio essa cidade!

pede vinte tempos e a gente entra pela porta. ela está numa lã preta com a barriga engravidada e canta o cravo brigou com a rosa. embaixo de uma… descalça. calça social feminina, marrom acinzentada.

a bola estoura. pasma a face. abre o casaco tira o casaco. da camisa caem folhas de papel todos rosas. cor de pele. ela tira do bolso uma bola plástica cor pele. ela tenta encher. a bola e estoura. ela está com a face estranha, treme, enche a terceira bola. por vezes fez força e não consegue encher. ouve-se esforço para respirar. é como se pudesse morrer.

moira sufoca. tá muito vermelha. a bola escapa. ela se ajoelha. ri, infantil. tosse, no chão, chora, ri e chora, o que faz? mexe nos papéis, no chão

disseram que eu tava triste. ri sonoramente. depois a risada perde força e ela toca o próprio corpo. terreno minado. ela soca o próprio corpo. a barriga. o peito, as pernas.

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